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“Long-term albumin administration in decompensated cirrhosis (ANSWER): an open-label randomised trial”


Comentários sobre o artigo Long-term albumin administration in decompensated cirrhosis (ANSWER): an open-label randomised trial. Paolo Caraceni, MD; Oliviero Riggio, MD; Prof Paolo Angeli, PhD; Carlo Alessandria, MD; Sergio Neri, MD; Francesco G Foschi, MD; Fabio Levantesi, MD; Aldo Airoldi, MD; Sergio Boccia, MD; Gianluca Svegliati-Baroni, MD; Stefano Fagiuoli, MD; Roberto G Romanelli, PhD; Raffaele Cozzolongo, MD; Prof Vito Di Marco, MD; Vincenzo Sangiovanni, MD; Filomena Morisco, MD; Pierluigi Toniutto, MD; Annalisa Tortora, MD; Rosanna De Marco, MD; Prof Mario Angelico, MD; Irene Cacciola, PhD; Gianfranco Elia, MD; Alessandro Federico, PhD; Sara Massironi, PhD; Riccardo Guarisco, MD; Alessandra Galioto, MD; Giorgio Ballardini, MD; Maria Rendina, MD; Silvia Nardelli, MD; Salvatore Piano, PhD; Chiara Elia, MD; Loredana Prestianni, MD; Federica Mirici Cappa, PhD; Lucia Cesarini, MD; Loredana Simone, MD; Chiara Pasquale, MD; Marta Cavallin, MD; Alida Andrealli, MD; Federica Fidone, MD; Matteo Ruggeri, PhD; Andrea Roncadori, BSc; Maurizio Baldassarre, PhD; Manuel Tufoni, MD; Giacomo Zaccherini, MD; Prof Mauro Bernardi, MD. The Lancet. Volume 391, ISSUE 10138, P2417-2429, June 16, 2018


Dra. Renata Perez


O uso de albumina em pacientes cirróticos está bem estabelecido em algumas situações específicas, tais como na paracentese de grande volume e no tratamento da peritonite bacteriana espontânea (PBE). Entretanto, as evidências científicas sobre o eventual benefício do tratamento prolongado com albumina em pacientes cirróticos ainda são escassas. O estudo “Long-term albumin administration in decompensated cirrhosis (ANSWER): an open-label randomised trial” de Caraceni et al. (1), mais conhecido como estudo ANSWER (human Albumin for the treatmeNt of aScites in patients With hEpatic ciRrhosis), publicado no mês de junho do periódico Lancet, trouxe importante contribuição para este tema. Este estudo teve como objetivo avaliar a eficácia da administração prolongada de albumina humana em pacientes com cirrose descompensada.

 

O estudo foi multicêntrico, randomizado e aberto. O recrutamento foi realizado em 33 hospitais da Itália e foram incluídos pacientes cirróticos com ascite não complicada, em tratamento com diuréticos anti-aldosterona (dose ≥ 200mg/dia) e furosemida (dose ≥ 25mg/dia). Foram randomizados 440 pacientes e incluídos na análise 431 pacientes. Os pacientes foram randomizados para receber tratamento padrão com (n=218) ou sem (n=213) albumina por 18 meses. A albumina humana foi administrada em dose de 40g duas vezes por semana por duas semanas e, a seguir, 40g por semana. O estudo demonstrou uma sobrevida global em 18 meses significativamente maior no grupo tratado com albumina (77% vs. 66%; p=0,028).

 

O grupo albumina apresentou menor incidência de ascite refratária, PBE e outras infecções bacterianas, síndrome hepato-renal e encefalopatia hepática graus 3 e 4. Além disso, houve neste grupo menor necessidade de paracenteses e menor número de internações hospitalares. Não houve diferença entre os grupos quanto à incidência de hemorragia digestiva por varizes esofago-gástricas e nem quanto a eventos adversos graves (graus 3 e 4) relacionados à infusão de albumina. O estudo concluiu que a administração prolongada de albumina pode prolongar a sobrevida em pacientes com cirrose descompensada.


No estudo ANSWER não foram incluídos pacientes com ascite refratária. Estes pacientes foram avaliados em outro estudo recente, intitulado “Long-term administration of human albumin improves survival in patients with cirrhosis and refractory ascites”, de Di Pascoli et al. (2), que teve como objetivo avaliar o efeito da administração prolongada de albumina humana na sobrevida de cirróticos com ascite refratária. Este estudo foi unicêntrico, realizado também na Itália, e incluiu 70 pacientes, dos quais 45 foram alocados de forma não-randomizada para receber albumina 20g, duas vezes por semana, em associação ao tratamento padrão, por 24 meses. Este grupo foi comparado com os outros pacientes que receberam apenas o tratamento padrão.

Observou-se que a mortalidade foi significativamente menor no grupo tratado com albumina (41,6% vs. 65,5%; p=0,032). Este grupo também apresentou menor incidência de encefalopatia hepática, PBE e outras infecções bacterianas. O estudo concluiu que o tratamento prolongado com albumina tem impacto positivo na sobrevida dos pacientes com ascite refratária. Embora seus resultados estejam alinhados com os do estudo ANSWER, este estudo envolveu uma casuística menor e não foi randomizado. Os resultados destes estudos se somam com a de dois outros anteriores (3,4), que também observaram benefício com o uso prolongado de albumina. Analisados em conjunto estes estudos vem acumulando evidências que apontam para o potencial benefício do tratamento prolongado com albumina em pacientes com cirrose descompensada.


O impacto positivo da albumina em cirróticos pode ser justificado pelo fato da albumina ser uma proteína multifuncional que tem diversas funções biológicas (5). A ação da albumina não se restringe apenas ao aumento do volume intravascular, a albumina também apresenta propriedades anti-inflamatórias e vasoconstrictoras. Desta forma, poderia atuar em vários mecanismos patogênicos implicados na cirrose (vasodilatação, redução do volume arterial efetivo e inflamação).
Entretanto, apesar da albumina em uso prolongado representar uma potencial perspectiva para o tratamento futuro dos pacientes com cirrose descompensada, considera-se que, no momento, ainda não há evidências suficientes para se incorporar o seu uso na abordagem de pacientes com cirrose descompensada, na prática clínica atual. A principal consideração é que estes estudos não são duplo-cego e placebo controlados. A ausência de um grupo placebo poderia influenciar os resultados, sobretudo considerando a possibilidade de um acompanhamento médico mais rigoroso no grupo tratado com albumina em virtude das consultas semanais para infusão de albumina. Este comparecimento semanal às unidades de saúde poderia favorecer um controle mais cuidadoso da adesão à dieta hipossódica, uso de medicamentos e a intervenção mais precoce nos casos com necessidade de ajustes de medicação ou tratamento de complicações.


Uma evidência em sentido contrário foi trazida pelo estudo de Solà et al. (6) que não observou benefício do tratamento prolongado com albumina (40 g a cada 15 dias) em associação com midodrina na evolução de pacientes cirróticos listados para transplante e este estudo teve o mérito de ser randomizado, duplo-cego e placebo controlado. Vale ressaltar, entretanto, que a dose de albumina utilizada neste estudo foi menor do que a dose administrada no estudo ANSWER (40g/semana).


Estes dados ressaltam a necessidade de novos estudos para se consolidar melhor as evidências em favor do tratamento prolongado com albumina em pacientes cirróticos. Se estes potenciais resultados favoráveis da albumina se confirmarem, ainda serão necessários novos estudos para definir que subgrupo de pacientes teria maior benefício com a administração prolongada de albumina e também para avaliar diferentes esquemas de dose e periodicidade, de forma a obter a melhor relação custo-benefício possível.

 

Referências:

1. Caraceni P, Riggio O, Angeli P, et al. Long-term albumin administration in decompensated cirrhosis: an open-label randomised trial. Lancet 2018; 391: 2417-29.
2. Di Pascoli M, Fasolato S, Piano S, Bolognesi M, Angeli P. Long-term administration of human albumin improves survival in patients with cirrhosis and refractory ascites. Liver Int 2019; 39(1):98-105.
3. Gentilini P, Casini-Raggi V, Di Fiore G, et al. Albumin improves the response to diuretics in patients with cirrhosis and ascites: results of a randomized, controlled trial. J Hepatol 1999; 30: 639-45.
4. Romanelli RG, La VG, Barletta G, et al. Long-term albumin infusion improves survival in patients with cirrhosis and ascites: an unblinded randomized trial. World J Gastroenterol 2006; 12: 1403–07.
5. Garcia-Martinez R, Caraceni P, Bernardi M, Gines P, Arroyo V, Jalan R. Albumin: pathophysiologic basis of its role in the treatment of cirrhosis and its complications. Hepatology 2013; 58: 1836–46.
6. Solà E, Solé C, Simón-Talero M, et al. Midodrine and albumin for prevention of complications in patients with cirrhosis awaiting liver transplantation. A randomized placebo-controlled trial. J Hepatol. 2018 Dec;69(6):1250-1259.

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